Doutor Estranho: No Multiverso da Loucura – Crítica (sem spoilers)


MUITO Sam Raimi e pouco fanservice. Uma troca justa?

 

 

 

Em uma das muitas entrevistas de Kevin Feige (o rosto por trás do MCU), ele mencionou que Doutor Estranho: No Multiverso da Loucura iria se aventurar no gênero de horror e que os fãs da franquia Evil Dead, em especial, fãs de Evil Dead 2 ficariam satisfeitos como trabalho de Sam Raimi. Isso se mostrou verdade? Sim, em ambas as partes. O maior mérito de Multiverso da Loucura tem nome: SAM RAIMI.


O diretor consegue evocar elementos de horror de seus melhores trabalhos, mesclar com humor e elevar os limites estabelecidos em outras produções da Marvel. Estamos diante de um direção ousada que não mede esforços para chocar o público e que nunca estaciona em um lugar comum. Algumas sequências de ação são muito inventivas (principalmente no que se trata de como a magia é usada no longa, um salto gigantesco em comparação ao primeiro filme), os embates em sua maioria embates são marcantes, principalmente aqueles que brincam com os limites da violência do longa. O tom nunca se altera, conseguindo manter um equilíbrio praticamente impecável mostrando o controle que uma direção firme tem sobre uma obra. Quanto a assinatura do diretor, ela está presente nos mínimos elementos da obra, e até mesmo em simples cenas de diálogo há um brilho pela ótica de Raimi. Fora isso, o filme é um aceno a diversas de suas obras, parecendo uma auto-celebração em diversos momentos, o que também funciona, recriando movimentos de câmera característicos e maneirismo visuais cheios de identidade. Fora as várias referências a trilogia de Evil Dead, até mesmo Evil Dead 3: Army of Darkness não escapa de homenagens escrachadas no clímax do filme. (cof, cof… Ash Williams zumbi…) 

Se o filme pudesse ser resumido de alguma forma, a mais certeira seria: um retorno glorioso de Sam Raimi ao cinema. Seria perfeito se o roteiro acompanhasse a direção…

As maiores falhas se fazem presentes no roteiro e em arcos de alguns personagens. Começando pelo Doutor Estranho de Benedict Cumberbatch (no próximo parágrafo a atuação será discutida, aguentem aí), seu personagem não tem qualquer tipo de aprendizado ou evolução ao longo da trama, ele apenas é movido por ela. Todo o tempo o roteiro tenta colocar Strange a prova seja nos problemas de seu ego, consequências de ações de filmes anteriores ou consequências de ação de outros Strange’s, mas falha em desenvolver algo entorno disso. Outros problemas se fazem presentes na personagem América Chavez interpretada por Xochitl Gomez, ela é mais um MacGuffin (objeto  presente em uma trama que o herói e vilão precisam para atingir diferentes objetivos) do que uma personagem. Seu arco é atrapalhado pelo ritmo e falha em criar um desenvolvimento crível ou satisfatório da mesma. Sua relação com Strange é abrupta e não consegue criar qualquer tipo de conexão com o espectador. Ainda sobre problemas de arco, está a conclusão da Feiticeira Escarlate interpretada por Elizabeth Olsen. Sua personagem é a que tem a maior crescente e destaque ao longo da obra, porém, a resolução de seu arco no clímax é fraca. Falta peso, falta desenvolvimento, faltam diálogos melhores e um tempo maior de tela dedicado a isso. É insatisfatório e não faz jus a essa obra e todas as outras que vinham trabalhando o que deveria ser concluído aqui. Todos esses problemas acabam colaborando para enfraquecer justamente onde o filme deveria ser mais forte.

 

Por outro lado, a atuação de Benedict Cumberbatch continua impecável e carismática, o que sustenta um personagem que não encontra evolução ou desenvolvimento. Elizabeth Olsen como a Feiticeira Escarlate, é a melhor atuação do longa. Vemos sua fragilidade, sua ameaça e a química com Benedict é ótima. Uma personagem memorável. Xochitl Gomez é carismática e só. Benedict Wong como Wong não tem muito o que fazer no filme e Rachel McAdams como Christine exigia um destaque maior, outra que padece de desenvolvimento narrativo. Quanto a outras aparições, “as surpresas” não são nada mais que um desperdício.  

Um filme contido e que leva o título de Multiverso da Loucura até é uma quebra de expectativa interessante e em certo ponto um acerto, mas a partir do momento que ele se dedica a abraçar o fanservice mais precisamente a aparição dos Illuminatis (um elemento tanto alardeado  na campanha promocional do filme), ele falha. Se por um lado, eles possuem uma função narrativa e rendem uma cena interessante, por outro, tudo soa gratuito demais e pouco “recompensador”. Uma “faca de dois gumes”. 


Um problema semelhante a este, está na montagem do filme. Ela é ágil, está sempre avançando a história e por mais que isso funcione dentro do segundo ato, acaba encontrando seu maior problema na conclusão dos principais arcos de personagens e estrutura do filme. Um ritmo que acaba se auto sabotando no final das contas… 

A trilha sonora de Danny Elfman é pouco marcante e não acompanha o nível da direção, mas apresenta uma ou outra faixa inspirada. Alguns acordes também servem como uma auto-homenagem para o compositor, remetendo ao tema da trilogia do Homem-Aranha e alguns de seus trabalhos em filmes do Tim Burton. Não é nada demais (digo isso com pesar).

Dentro de tantos filmes do Universo Cinematográfico da Marvel temos um raro caso onde méritos técnicos são a maior força de um filme e o roteiro e personagens não acompanham transformando o longa em uma união frágil. Sam Raimi merece todos os elogios, por sua ousada e marcante direção que carrega o filme nas costas. No entanto, o saldo final seria muito positivo se o casamento entre direção e roteiro fosse mais satisfatório…

Com muito pesar, temos mais um produto do Universo Cinematográfico da Marvel que não atinge seu potencial. Uma sina que está se tornando recorrente, constante e sempre recente.

 



Nota: 6,5/10

 

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