John Wick – De Volta ao Jogo (2014) foi responsável por duas coisas. Trazer Keanu Reeves de volta às telas em um papel de destaque e trazer um novo fôlego ao gênero de filmes de ação. David Leitch e Chad Stahelski que na época eram dublês profissionais e coordenadores de dublês, estrearam na direção entregando sequências memoráveis que apostaram menos em cortes rápidos e câmeras tremidas (tendência em filmes do gênero) e mais em planos sequências e planos abertos o que se tornou a maior características da franquia e influenciou diversos outros projetos como a série do Demolidor da Netflix e Atômica com Charlize Theron, para citar alguns exemplos. Esse sucesso garantiu duas sequências que elevaram esse ponto tão marcante do primeiro filme se aprofundando em uma história simples e em universo interessante o suficiente. No entanto, como toda fórmula, essa também apresentou sinais de desgastes no último filme John Wick: Parabellum de 2019.
Como superar a iminência de um desgaste? A resposta do diretor Chad Stahelski e sua equipe vem em forma de um filme que não apenas é superior a seu original, mas que também é um dos melhores filmes de ação dos últimos anos.
Esse quarto capítulo é o mais longo da franquia o que poderia ser sua maior fraqueza, afinal, acompanhar socos e tiros durante 2 hrs 50 minutos poderia se tornar um pouco enjoativo, mas não é o caso aqui. Cada nova sequência de ação que o filme apresenta é diferente, inventiva, por vezes mais intimista e em outras, gigantesca. A direção de Chad Stahelski aposta novamente em planos abertos onde a ação tem espaço para ser apreciada mostrando toda a competência do trabalho de dublês e as coreografias de combate criadas para as sequências de ação. O aproveitamento dos cenários nessas sequências também é outro ponto de destaque, servindo para nos ambientar naquele mundo neo-noir tão opressivo, mas ao mesmo tempo irresistivelmente belo com suas cores gritantes e hipnóticas. Os cenários não são um mero complemento visual, servem também como um personagem, um ponto importante da narrativa que torna sua importância em um elemento palpável e real daquela jornada cheio de perigos e combates. Os cenários são reais, são vivos. Muito do mérito da cinematografia de Dan Laustsen que atinge seu ápice, entregando o filme mais visualmente atraente da franquia até então. Embalando todos esses méritos está a edição precisa de Evan Schiff que reúne organicamente cena a cena, tornando o filme uma experiência que tecnicamente é praticamente perfeita.
Talvez os únicos problemas do filme estejam presentes no roteiro simplista de Shay Hatten e Michael Finch. Não que o roteiro falhe em apresentar uma jornada minimamente bem conduzida, mas os diálogos expositivos e frases de efeito encontram um cansaço a certa altura mesmo que seja parte da identidade da franquia. Por outro lado, o texto consegue equilibrar bem a linha entre humor e dramaticidade embora encontre uma força maior no primeiro aspecto.
As novas adições que o quarto filme traz também merecem todos os elogios, Donnie Yen como Caine rouba a cena. Um personagem extremamente carismático e presente nas melhores sequências de combate. Além do ator entregar um enorme carisma, seu timing cômico é preciso. Bill Skarsgard, o antagonista da vez, funciona mesmo com um texto extremamente previsível para seu personagem. Scott Adkins como Killa, o chefe da cúpula alemã, é outro destaque além de ter uma caracterização extremamente interessante que torna o ator irreconhecível. Shamier Anderson como o Sr. Ninguém, outro personagem inédito, é também um destaque. Há muitas escolhas criativas assertivas ao redor de seu personagem e o ator entrega o necessário para torná-lo memorável. Hiroyuki Sanada talvez seja o mais fraco dentre as novas adições, entregando um papel que não foge da zona de conforto dos outros trabalhos em que apareceu. No entanto, a filha de seu personagem, Rina Sawayama como Akira, tem bons momentos e desempenha um papel de destaque na introdução do filme.
Quanto aos rostos já conhecidos da franquia não há muitas novas facetas a serem exploradas. Keanu Reeves continua mantendo o equilíbrio invejável entre o carisma e a cafonice, suas frases de efeito ainda são engraçadas e sua entrega na ação mais crível do que nunca. Nesse quarto longa há uma atenção a uma faceta mais dramática do personagem que dentro de suas limitações Keanu consegue explorar. Ian McShane e Lauren Fishburne não se entregam muito, deixando a desejar nos momentos mais dramáticos, embora seus personagens ainda completem o núcleo principal de maneira eficiente. Uma menção honrosa para a breve passagem de Lance Reddick que faleceu recentemente e que tem uma presença bastante marcante no filme.
John Wick 4: Baba Yaga ainda encontra um tempo para ser ousado em suas decisões criativas e subverter expectativas. De muitas formas o filme é uma conclusão e embora existam pontas soltas para serem exploradas em futuros derivados, a narrativa estabelecida no primeiro filme encontra um final digno aqui. Temos um entretenimento de primeira com uma competência técnica invejável. O quarto filme definitivamente é uma experiência para se apreciar no cinema.
Nota: 8,0/10